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Para Taurus (TASA4), é míope a visão de que uma empresa de armas não pode ser ESG
Publicado em: 03/11/2022
A Taurus (TASA4), empresa brasileira que é líder mundial na fabricação de revólveres e uma das maiores produtoras de pistolas do mundo, chamou a atenção do mercado no início de outubro ao criar um comitê interno focado em iniciativas ESG, sigla em inglês para ambiental, social e governança.
A sigla tem se popularizado ao longo dos últimos anos no mercado financeiro e, para uma parte dos investidores, tornou-se essencial que as empresas adotem um modelo de negócios que persiga esses três pilares, e com a Taurus não é diferente.
Há a busca pelo respeito ao meio ambiente, preocupação com o lado social e uma gestão responsável, de modo que a companhia se coloque como um negócio que persegue a sustentabilidade em várias esferas.
Para atrair esses investidores, as empresas com capital aberto têm procurado se organizar para criar e implementar iniciativas ESG e divulgá-las ao público. Para algumas companhias, trata-se apenas de divulgar ações que já eram executadas, mas que antes estavam descoordenadas e sem o carimbo do ESG.
No caso da Taurus, como o armamento é um tema sensível e divide opiniões no aspecto social, poderia-se argumentar que a empresa teria dificuldades para se posicionar como uma empresa ESG.
No entanto, em conversa com a Agência TradeMap, o CEO da companhia, Salesio Nuhs, rechaçou essa ideia.
Para ele, esta é uma percepção preconceituosa e míope, já que, na visão dele, a empresa é essencialmente ESG por atuar no setor estratégico de defesa. Este ramo de atividade, ele salienta, permite que a companhia ofereça maior segurança tanto para a população quanto para o país.
Na opinião do CEO, a Taurus contribui para a soberania do país, tornando o Brasil menos vulnerável a eventuais ameaças de outros países.
Além disso, ele diz, a Taurus fornece armas para segurança pública, suprindo a necessidade das polícias no Brasil e no mundo, e permite que o cidadão defenda a própria casa. Todos esses pontos são voltados para maior segurança das pessoas, ressaltou.
Quais são as iniciativas ESG da Taurus?
A nova organização da Taurus em relação ao ESG se divide em duas estruturas.
A primeira dela é o já citado comitê de ESG, que conta com a alta direção da empresa e vai trabalhar para que os projetos sejam mensurados de forma mais assertiva e gerem melhores resultados.
A segunda é o departamento de ESG, que reúne dois especialistas no tema contratados pela empresa e estará atento para identificar possíveis áreas que estejam gerando algum dano ESG e incluir os responsáveis de cada área na correção ou diminuição destes problemas, montando, para aquela situação específica, uma equipe multidisciplinar variável, com representantes de cada área da empresa.
O objetivo dessa estrutura montada pela Taurus é reforçar ações que a empresa já aplicava, mas que antes estavam desorganizadas, e implementar novas iniciativas.
Na pandemia, por exemplo, a Taurus patrocinou e ajudou no desenvolvimento dos chamados “face shields”, aqueles protetores faciais que lembram uma viseira e foram usados para proteção contra o vírus. A empresa doou 500 mil unidades em todo o Brasil, segundo Nuhs.
Outro exemplo é o desenvolvimento de profissionais por meio de um convênio feito com a Universidade do Vale dos Rio dos Sinos (Unisinos), para atacar uma escassez que havia de engenheiros de armamento.
Hoje, a empresa conta com mais de 200 engenheiros da área, além de ter um MBA (Master in Business Administration) feito pela própria Taurus, de gestão e manufatura.
O CEO disse que o desenvolvimento de pessoas faz parte do futuro da Taurus e citou ainda projetos sociais de inclusão em parceria com a Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), entre outros.
Segundo Nuhs, a empresa também terá uma preocupação voltada para a pauta ESG na aquisição de novos equipamentos, dando prioridade a critérios como gasto excessivo de água, energia, emissão de gases, entre outros.
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Além do retorno social e ambiental, são ações que podem gerar retornos financeiros para a empresa, como, por exemplo, a utilização de energias renováveis, que podem ser mais baratas, reduzindo as despesas operacionais.
As melhores práticas, disse o CEO, permitirão que a empresa obtenha um retorno financeiro no curto prazo, além de contar com colaboradores mais qualificados, equipamentos e tecnologia mais modernos.
O novo modelo, defendeu o executivo, vai além da geração de relatórios sobre o tema ESG. A ideia da empresa é que as melhores práticas se tornem parte da cultura corporativa, para que todos os colaboradores desenvolvam esta consciência e participem das ações.
Como mensurar e quais os benefícios para o investidor?
A empresa deverá contar com dois protocolos globais utilizados para mensurar as práticas ESG, o GRI (Global Reporting Initiative) e o SASB (Conselho de Padrões Contábeis de Sustentabilidade).
Estes protocolos servirão para auxiliar a empresa a emitir relatórios padronizados que facilitem o trabalho de análise e acompanhamento dos indicadores ESG nas demonstrações financeiras. Portanto, o leitor poderá acompanhar o desempenho da empresa quanto ao ESG de forma mais clara e transparente.
A Taurus além do ESG
Sediada em São Leopoldo (RS), a Taurus é uma companhia Estratégica de Defesa e integrante da Base Industrial de Defesa (BID), conjunto de empresas estatais ou privadas que participam de pesquisa, desenvolvimento, produção, distribuição e manutenção de produtos de defesa.
Ao longo de seus 82 anos de história, a empresa se tornou referência em mercados desenvolvidos, como os Estados Unidos, além de liderar o negócio de armas no Brasil, com base em suas duas unidades produtivas: de Bainbridge, na Geórgia (EUA), e de Haryana, na Índia.
Ao longo desse tempo, a companhia passou por relevantes transformações, sendo a principal delas o turnaround realizado em meados da década passada.
Em 2014, a CBC (Companhia Brasileira de Cartuchos) passou a comprar as ações da então Forja Taurus e passou a deter o controle da maioria das ações após um aumento de capital.
Em fevereiro do ano seguinte, a CBC passou a controlar definitivamente a operação da Taurus, após a anuência do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). De lá, veio o atual CEO da companhia, Salesio Nuhs, que implementou uma mudança no modelo de negócio.
A partir do turnaround que se estabeleceu nos anos seguintes, a Taurus passou a se colocar como uma empresa global, que exporta para mais de 100 países, sendo uma das maiores fornecedoras de munição para a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
Como a Taurus ganha dinheiro
A Taurus nada mais é do que uma produtora de pistolas, revólveres, armas longas, carabinas e acessórios, que equivalem a 95,7% da receita da empresa, com as marcas Taurus, Heritage Manufacturing e Rossi. A companhia também opera peças de metal injetado e capacetes.
No primeiro semestre deste ano, a receita líquida da empresa foi de R$ 1,30 bilhão. Ou seja, R$ 1,24 bilhão oriundos de armas e acessórios, e cerca de R$ 60 milhões vindos de peças de metal injetado e capacetes.
No período entre julho e setembro deste ano, a empresa registrou um lucro líquido de R$ 100,8 milhões, montante 47,9% menor do que o apresentado no mesmo período do ano passado.
A queda foi ocasionada pela reversão das receitas financeiras líquidas para despesas líquidas; além de maiores despesas operacionais, com aumento dos gastos com marketing e pessoal para promover os negócios, sobretudo nos Estados Unidos.
Exposição ao maior mercado do mundo
Hoje, a Taurus é altamente competitiva no mercado mais desenvolvido do setor, que são os Estados Unidos. Isso porque o país é um reduto dos defensores da legítima defesa com a posse de armas de fogo, em um entendimento que remete à Constituição de 1791.
Esse viés permanece em voga no país, mesmo com o Congresso com a maioria democrata. Após quase dois anos do governo de Joe Biden, nenhuma mudança drástica foi instaurada no país ou nos estados americanos.
Segundo o CEO da Taurus, a venda de armas cresce, em média, 7% ao ano no país, e a companhia estar bem fincada neste mercado é essencial.
O crescimento das despesas operacionais vem à tona numa tentativa de tentar angariar participação de mercado e remodelar o posicionamento. A empresa escolheu investir em marketing e novos projetos de produtos, aumentando o tíquete médio das armas, e não simplesmente repassar o aumento dos custos aos consumidores americanos.
No ano passado, houve um aumento médio de 10% nos produtos do setor nos Estados Unidos, acompanhando a forte demanda.
A Taurus, por escolha própria, lançou novos produtos, aumentando o preço médio por produto, elevando a percepção de valor agregado de cada um, e não simplesmente elevando os preços dos produtos que já estavam na prateleira. O tíquete médio saltou US$ 60 em dois anos (+30%).
No que se refere ao repasse de preços no Brasil, o aumento dos preços é realizado anualmente, acompanhando a variação do IGP-M (Índice Geral de Preço – Mercado) de seus produtos.
Mesmo assim, a Taurus pratica valores mais em conta do que a concorrência que importa as armas para o país, segundo o CEO.
Compensando o cenário volátil do curto prazo
Para atuar no mercado global em meio à volatilidade econômica mundo afora, a Taurus preza pela qualidade de seus produtos, entendendo ser a melhor forma de conseguir fidelizar a concorrência.
No Brasil, a empresa tem um alto índice de satisfação dos clientes no Reclame Aqui (nota 9,0 de 10,0, levando em conta o índice RA1000), embora o contingente de reclamações seja baixo em comparação a empresas do varejo comum.
A Taurus faz a gestão de uma estrutura de pré e pós-venda, com uma rede de 3 mil lojas parceiras para atender os clientes no Brasil. O resultado histórico é o controle de cerca de 80% de todo o mercado local.
Essa volatilidade econômica diz respeito principalmente ao aumento dos custos de produção relacionados à inflação. Na produção de armas, a commodity que mais influencia em termos de preço é o aço e, naturalmente, o minério de ferro.
Mesmo que o preço dessas commodities tenha arrefecido nos últimos meses, a Taurus está diversificada globalmente e não depende exclusivamente da oferta brasileira. A companhia tem procurado matérias-primas na Itália e Turquia, aumentando o quadro de fornecedores.
A guerra entre Rússia e Ucrânia, que está prestes a completar nove meses, traz uma incerteza adicional, que faz com que a empresa tenha de atuar ativamente na aquisição e gestão de preços de matérias-primas. No pico da Covid-19, onde a produção parou, a empresa chegou a ampliar seus estoques em seis vezes.
Cenário político não preocupa Taurus
O tema do armamento da população é sensível do ponto político-social, e as decisões que são tomadas nos âmbitos da Justiça podem reverberar nos negócios da Taurus. Ao menos é assim que o mercado pode enxergar.
No início de setembro, por exemplo, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin suspendeu decretos que flexibilizam o porte de armas de fogo e a compra de munições, em decretos e portarias oriundas do presidente Jair Bolsonaro, um defensor da flexibilização do armamento.
A decisão, reiterada no dia 20 de setembro, foi tomada pelo ministro com a justificativa de “risco de violência política”. Embora a suspensão tenha efeito prático sobre os CACs (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador), Nuhs fez questão de amenizar a influência da medida.
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A decisão do STF atua sobre tipos específicos de armas que representam apenas 3% da receita da Taurus e que, majoritariamente, são exportadas aos Estados Unidos. Portanto, não há empecilho adicional ao faturamento da empresa no país.
Quanto à eleição presidencial, ainda que os dois candidatos tivessem visões diferentes em relação ao armamento, a empresa disse à Agência TradeMap, antes da definição do segundo turno, que o resultado da disputa não teria “impacto material negativo” na operação da companhia.
No entanto, no primeiro dia após a vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva, as ações da Taurus fecharam em queda de 6,96%.
O CEO da Taurus se apoia no referendo popular em 2005, que decidiu que os brasileiros têm direito de legítima defesa, não aprovando o Estatuto do Desarmamento. À época, 63% dos brasileiros votaram a favor do comércio de armas.
Equilibrando as dívidas
A Taurus, até o segundo trimestre, registrava uma dívida bruta de R$ 592 milhões, sendo que 98,7% era indexada à moeda norte-americana. No entanto, a receita advinda de operações dolarizadas girava em torno de 72%, o que pode aumentar a proporção das dívidas caso o dólar valorize.
Porém, o CFO da companhia, Sérgio Sgrillo Filho, que também participou da conversa, mencionou que, para montar a estrutura de dívidas, é feito um relatório baseado na exposição dos ativos e passivos à moeda americana. Além disso, entende que é mais barato captar dívidas em dólar do que em reais a uma taxa CDI de 13,65% ao ano.
Portanto, nessa estratégia está incluso o risco cambial, que é compensado por menores gastos futuros em derivativos utilizados para proteção.
Esta estratégia faz parte de um plano que tem dado certo ao longo do tempo, uma vez que a alavancagem da empresa tem sido cada vez menor. Ou seja, a empresa demonstra alta capacidade em honrar com as dívidas e reduz o risco de insolvência. Além disso, os custos financeiros são menores, aumentando a rentabilidade do negócio.
Em 2018, ano em que Nuhs assumiu a Taurus, a empresa reportava uma alavancagem de 11,2 vezes e, no segundo trimestre de 2022, esta proporção era de 0,3 vez.
Apesar disso, outro ponto do endividamento que traz um risco maior é o fato de quase 80% das dívidas da empresa apresentarem um vencimento no curto prazo. Isto pode reduzir a flexibilidade de caixa da empresa, podendo se refletir em menores investimentos e comprometer o crescimento.
Diante disso, a empresa busca fazer acordos com os bancos para alongar as dívidas. Segundo o CFO, a empresa irá renegociar as dívidas com os bancos que permitem uma exposição maior ao endividamento e alongar os prazos em três anos a partir de 2024.
O que traria um alívio para o caixa da Taurus e assim poderia equilibrar os recursos alocados em investimentos e as obrigações a pagar
Fonte: TradeMap-SP - WEB